Os desafios de desmistificar um destino que ainda é subaproveitado pelos turistas nacionais
Na hora de escolher o destino para fazer uma viagem pelo Brasil muitas cidades vêm à mente. Rio de Janeiro? Florianópolis? Salvador? Gramado? E se, para fugir do convencional, o Norte do país fosse escolhido como destino? Alguns vão dizer que “a Amazônia é muito selvagem” ou perguntar: “o que tem pra fazer lá?”. Há ainda aqueles que vão dizer: “não quero visitar floresta, gosto de praia”. Essas frases representam os pensamentos e a ideias prévias que predominam na cabeça da maioria dos brasileiros que residem no Sul e no Sudeste. A grande maioria pouco conhece sobre a diversidade dos estados mais próximos da linha do equador.
Como consequência dessa mentalidade, a região Norte é a menos frequentada pela população do Sudeste, região que mais envia turistas para outras partes do país. Segundo o Portal Brasil, do Governo Federal, apenas 0,4% do fluxo desses turistas escolhe o Norte para visitar.
“Infelizmente, há pouco interesse em conhecer o Norte do Brasil de forma geral. Na fazenda dos meus pais, a maioria dos visitantes são estrangeiros, europeus, principalmente alemães e franceses”, destaca Isabel Brito, professora e doutora em desenvolvimento sustentável e de família nortista.
Patrimônio cultural imaterial brasileiro, o ritmo carimbó é o mais tradicional no litoral paraense
Os motivos para a baixa atração turística são diversos.“Não há planejamento e estruturação para o turismo na região, é tudo muito ‘espontâneo’”, lamenta Brito. Fatores como a falta de investimento na infraestrutura, pouca divulgação do potencial do turismo e a grande oferta referente às outras regiões podem ser listadas como alguns exemplos.
Depois de ter tido o prazer de visitar o Norte do Brasil por três vezes nos últimos dois anos, concluí que o principal fator desse fenômeno social é a desinformação. Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins são jóias brutas do marketing turístico no Brasil, abafadas por estereótipos midiáticos e puro desinteresse. Por isso, vou tentar desmistificar esse velho lugar-comum, apresentando um pedacinho dessa surpreendente fonte de destinos ainda desconhecida por muitos de nós.
O estado: Pará
O Pará é imenso. É o segundo maior estado brasileiro em extensão, só perde para o Amazonas, seu vizinho de fronteira. Mas, mesmo sendo assim tão vultoso, a sua cultura ainda é vista como excêntrica pelos grandes meios de comunicação nacionais. Para quem decide conhecer essa região de perto, o que se vê, além das belezas naturais, é a lealdade às tradições das matrizes indígenas e africanas. Nas danças, festejos e gastronomia é possível perceber vivos os traços culturais inspirados por essas expressões.
A colonização portuguesa no século XVII também deixou marcas no território paraense, visíveis na arquitetura e na forte devoção cristã. Anualmente, acontece a maior manifestação religiosa católica do Brasil, o Círio de Nazaré, na capital Belém. A procissão sai da Catedral da cidade e vai até a praça Santuário de Nazaré, percorrendo no total 3,6 quilômetros. O evento chega a reunir mais de dois milhões de romeiros todo mês de outubro em uma festa com mais de dois séculos de tradição.
Igreja N. S. do Rosário e as ruínas históricas de Joanes, na Ilha do Marajó
“Belém é uma cidade maravilhosa e pode ser, para muitos, uma porta de entrada para um Brasil diferente, pouco conhecido pelos brasileiros”, analisa Brito sobre o potencial turístico da capital do estado.
Além da arquitetura e das manifestações da cultura paraense, a cidade possui um circuito gastronômico que oferece aos visitantes a possibilidade de experimentar pratos singulares feitos com ingredientes nativos da região. Pato no tucupi, maniçoba, tacacá, caruru, suco de cajá são algumas das delicias da culinária local.
O destino escolhido: Ilha do Marajó
A imagem do mapa do território brasileiro que carregamos na nossa memória traz em seu extremo norte um círculo de terra que poderia facilmente ser o 28º Estado brasileiro pela sua dimensão e particularidade. A Ilha do Marajó, no entanto, pertence ao Estado do Pará. O povo marajoara deixa boas impressões aos seus visitantes: valoriza a cultura nativa da Ilha e vive a sua própria tradição, tornando a cultura paraense mais diversa e encantadora.
“Vou para Ilha de Marajó pelo menos duas vezes por ano, é o necessário para me abastecer de farinha de tapioca”, brinca Brito, que não é nascida na Ilha, mas tem toda sua família materna e paterna lá. Um turista que vai a Marajó deve primeiro ver um mapa “para enxergar a complexidade geográfica e a dimensão da ilha”, aconselha Brito. Afinal, em todo esse colosso natural banhado pelo Oceano Atlântico e pelos rios Amazonas e Tocantins, é possível ver igarapés, matas, mangues, campo e um litoral de praias exuberantes, tudo convivendo lado a lado.
O encontro de praia e mangue é uma paisagem típica da região marajoara
Algumas precauções são necessárias para a viagem não se transformar em uma dor de cabeça. Brito atenta para o cuidado com os pernilongos, o uso de roupas frescas (calças e blusas leves de manga comprida).
Uma dica é pegar o barco ao amanhecer, “a viagem pela manhã é linda”, sugere ela sobre as embarcações que fazem o trajeto de 3 horas de Belém à Ilha do Marajó.
O Norte tem duas estações, mas apenas uma sensação térmica: o calor. No verão, de junho a dezembro, o tempo é seco e no inverno, de janeiro a maio, é chuvoso. Por esse motivo, no período do inverno, boa parte da Ilha fica alagada, mas ainda assim apresenta boas opções turísticas, inclusive belos passeios de barco.
A Ilha do Marajó é a maior do território brasileiro e a maior ilha fluviomarítima do mundo, supera em extensão, inclusive, os estados de Alagoas e Sergipe. O território abriga o maior rebanho de búfalos do Brasil (cerca de dois por habitante da Ilha). Os ilhéus utilizam o animal para montaria – cheguei a ver búfalos sendo usados até como montaria policial – e consomem sua carne e leite.
“O que mais me chama atenção na cultura Marajoara (que também percebemos de forma geral no paraense) é o orgulho de pertencer ao lugar, isso é muito forte e articula a importância da comida, da música, das artes plásticas”, resume Brito.
Se você ainda não está convicto em programar sua próxima viagem à Ilha do Marajó ou a outrodestino do Norte, saiba que o custo geral de alimentação e hospedagem é um dos melhores que eu já presenciei. Convencidos? Agora sim. Malas prontas, cabeça aberta e boa viagem.
Fonte: www.namu.com.br
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