Neste sábado choveu a noite toda, choveu aos cântaros. Uma chuva insistente e generosa, dessas de encharcar a terra. No dizer do caboclo, choveu de cavalo beber água em pé. No dia seguinte, levantei cedinho e fui espiar a rua. Em razão do fim de semana, o logradouro não exibia o costumeiro frenesi de veículos, trabalhadores, donas de casa levando os filhos para a escola e restava apenas a ressaca desses dias festivos, um imenso marasmo. A bem da verdade, salvo um casal de idosos que com certeza se encaminhava para a missa das sete, nada mais; apenas o asfalto lavado como testemunha viva da chuvarada da noite passada.
Incrustado entre as ruas 9 e 10, em plena rua B, o meu quarteirão é – sem dúvida nenhuma – o mais charmoso da cidade. Os 200 metros que separam a praçinha do colégio Chico Mendes ao início do muro do Ceup tem um quê de bairro Nazaré, em Belém, ou de outras cidades, como Carolina.
Guardadas as devidas proporções e os evidentes exageros, o perímetro é um apanhado de residências típicas de classe média, de moradores antigos, alguns do início dos anos 80, escritórios, consultórios e imóveis locados para funcionários das empresas de Carajás e estudantes universitários, os últimos, aliás, dão um tom de jovialidade ao local. Para não fazer injustiça, há ainda os botecos, lanchonetes e o inoxidável boteco do Baixinho, esse já mais pras bandas da Mahatma.
Devo dizer, porém, que a urbanidade provinciana, o sossego dos fins de semana, em contraste com o corre-corre dos dias normais, nos quais achar uma vaga para estacionar é quase como acertar um bilhete premiado, são quase nada perto do ato de acordar cedo para contemplar a rara beleza margeada pelo muro da escola. Mangueiras de 30 anos oferecem graciosamente frutos, flores e sombra aos privilegiados passantes e aos residentes. A mistura da urbanidade do concreto com o balançar das folhas de mangueiras e fixo talvez seja o grande barato da coisa toda.
Talvez não tenha argumento para contrapor aos que me serão contrários. Dirão que padeço de miopia crônica, que as comparações são estapafúrdias e até mesmo que o bairrismo exagerado, longe de ser uma virtude, beira o ridículo. Talvez a minha bestificação matutina tenha me levado a exageros ( o que não seria a primeira vez, nem tão pouco a última), entretanto, outras ruas, outras avenidas podem ser mais bonitas, mais charmosas, mais importantes, mas eu não moro lá.
É como dizia o poeta, o rio Tejo pode ser até ser mais importante, mas não passa na minha aldeia.
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