Desde sua vitória, em outubro passado, os simpatizantes de Bolsonaro dizem que o Brasil “mudou”. Que mudou, mudou.. Mas o quanto mudou? Apesar do que dizem seus correligionários, Bolsonaro está bem longe de ser uma unanimidade no Brasil. Eleito no segundo turno com a terceira pior vantagem desde a volta da eleição direta em 1989, Jair precisa mostrar que a guinada que o Brasil deu à direita tem condições de se manter. Eleito com promessas basicamente eleitoreiras, vem mantendo sua popularidade à base do discurso antipetista, tentando – por enquanto com sucesso – esconder a falta de um plano para o país. Os números não mentem: dos 147 milhões de eleitores aptos a votar em 2018 no segundo turno, o candidato vencedor obteve 57 milhões de votos, contra mais de 89 milhões de brasileiros que NÃO o escolheram..
Para vocês terem uma ideia, a eleição mais apertada foi a de Dilma sobre Aecio, em 2014, com apenas 3,28% de diferença entre eles. Antes disso, Collor havia vencido Lula no segundo turno de 89 com apenas 6,06% de diferença e agora, Bolsonaro está na terceira posição, com 10,26% de diferença sobre Haddad. O grande campeão é Fernando Henrique que nas suas duas eleições venceu no primeiro turno, obtendo a maioria dos votos, tanto em 94 como em 98 e ambas sobre Lula. Foi um passeio! Aliás, a vitória mais esmagadora até hoje foi justamente a eleição de FHC sobre Lula, com 27,17% de diferença entre os dois. E apesar de Lula ter a fama de “bicho-papão” em eleições, na verdade, nunca ganhou uma no primeiro turno e curiosamente, mais perdeu do que ganhou (das 5 que disputou, perdeu 3 e ganhou duas).
Eu apresento esses números para que você, leitor, caia na realidade e passe a analisar o atual governo com isenção e imparcialidade (tanto a favor quanto contra). Bolsonaro é o primeiro que se elegeu de fato com bandeiras ideológicas, apesar de se dizer contra ideologias. Collor é de direita, mas não se usou essa discussão em 89. Fernando Henrique também não. Lula e Dilma idem, embora devamos fazer a ressalva que esses movimentos realmente começaram com a derrota apertadíssima de Aecio para Dilma. Ali nasceram coxinhas e mortadelas, patos e diversas outras alegorias que hoje são – infelizmente – comuns.
Bolsonaro precisa mostrar à sociedade que a Direita tem projeto para o país e não apenas discursos de palanque. Porque da esquerda, já se sabe o que esperar dela (para o bem ou para o mal). Quem precisa mostrar a que veio é a direita, ou corre o risco de enterrar de vez o seu projeto.
“A direita tem seus produtores de conteúdo, seus filósofos e ideólogos. Ignorar esse forro intelectual é uma aposta errada da esquerda e dos setores neoliberais, ao lidar com a questão. A nova direita conservadora usa sim, ignorância, confusão e desinformação como estratégias pontuais dessa guerrilha intelectual, mas isso não quer dizer que ela não saiba QUE ESTÁ fazendo isso, pelo contrário. A perseguição ideológica demonstra inequivocamente uma faceta ainda mais estarrecedora que a estratégia de ausência de debates sérios e as promessas de soluções fáceis pra problemas extremamente complexos; o que está em jogo hoje, é o embate no campo das ideias sobre empoderamento do discurso que deverá dominar as agendas globais nesse século, que por sua vez trarão consigo uma agenda econômica embutida. Trata-se de legitimação de retórica e – consequentemente – a desqualificação do contraditório.
E o que se vê hoje no campo intelectual é o embate entre correntes de pensamento, em que os movimentos conservadores, visando dar legitimidade à retórica que os embasa, atacam os princípios fundamentais do conhecimento humanista, que apesar de não ser perfeito, buscou no último século, consolidar conquistas individuais e coletivas, como direitos humanos, noções de civilidade e ênfase no social.
Foucault disse que “conhecimento é poder”; ele referia-se à consolidação dos discursos de dominação. E isso não acontece sem conhecimento. Conhecimento de si e dos seus adversários.
O populismo da nova direita conservadora se caracteriza pela privação de debates e promessas de soluções fáceis para problemas complexos. Tudo indicaria, portanto, que ela é contra o conhecimento, as artes e a ciência. Mas não é: a nova direita não é anti-intelectual, mas anti-elite intelectual.
Para além do que aparece na superfície, os neoconservadores possuem um projeto intelectual claro que, por um lado, persegue um tipo de conhecimento e, por outro, procura redefinir uma nova direção para a sociedade global”.
By: Vicente Reis
Referências: Rosana Pinheiro-Machado e Peterson Leal Pacheco.
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