De dentro de meu pequeno Ser, procuro Estar. Procuro ser melhor e, às vezes, fico olhando para o vazio… Do nada, o vazio se enche com a presença de meu amigo invisível!
Não me recordo quando, de fato, comecei a notar a presença dele em minha vida. Um dia, na minha infância, meu amigo Tião veio ter um dedo de prosa comigo. Era domingo, na boca da noite. Alertou-me sobre o rio. Disse-me para não ir nadar naquele dia. Fez-me prometer que não iria. Tião estava diferente. A pele negra dele brilhava mais que todas as vezes que estivéramos juntos. Nos abraçamos e ele se despediu com um sorriso que eu nunca vira, nunca sentira. Fiquei olhando-o sumir nas escadas que davam para a igreja. Segui na direção de casa. No caminho, passando pela rua em que Tião morava, vi muitas pessoas lá, cabisbaixas, sorumbáticas, melancólicas. Fui ver o que era. Teria o pai de Tião morrido? Mas não fora ele, o pai, que falecera. Quem tinha morrido foi o Tião, meu amigo, com 08 anos de idade. Mas como? Eu tinha acabado de falar com ele, abraçá-lo! Não poderia ser! Mas foi. Tião morrera afogado no rio, horas antes de falar comigo. Nunca consegui compreender o que aconteceu.
Vi a morte passar por mim em várias ocasiões. Quando perdi minha avó, alguns tios e tias, amigos. Eles estavam serenos. Não pareciam com raiva por terem morrido. E vi a morte perto de mim. Mas, meu amigo invisível não a deixava me tocar. Uma vez, dirigia a mais de 100 km/h numa estrada do Pará. Vi um poeirão pela frente naquela estrada de terra batida e esqueci de pisar no freio. Depois, a poeira cobriu minha visão. Fui freiando, aos poucos, sem entender direito o que estava acontecendo. Senti um toque suave do meu amigo invisível, senti uma voz dizendo “PARE”. Quando a poeira baixou, vi centenas de bois pela frente. Como passei entre eles sem bater em qualquer um, não sei. Minhas filhas olharam para mim, incrédulas, sem entender o que tinha acontecido. Os vaqueiros chegaram perto perguntando como eu tinha feito aquilo. Aquilo o quê?
Quando vim para Carajás, em 1988, vim a convite da CVRD, do doutor Mozart. Vim para administrar a Pousada Carajás. Antes de vir, eu tinha que arrumar dinheiro, uns 200 mil dólares na época. Consegui um empréstimo, somei com minhas economias, mas não eram suficientes. Eu estava no ônibus, a caminho do trabalho. Ia triste, pedindo para meu amigo invisível que me ajudasse a conseguir a quantia que eu precisava. De repente, não sei o porquê, desci do ônibus. Eu não estava em mim. Comecei a andar em direção à minha casa. Aí, como que guiado, parei numa casa lotérica, marquei um cartão e ganhei mais de 100 mil dólares!! Foi como consegui vir para Parauapebas…
Eu só vim compreender tudo isto, tempos depois. Vivi uma vida de nababo. Tive mulheres de todas as cores, todas as idades, como disse Martinho da Vila. O materialismo tomou conta de mim. Aí veio a surpresa. Meu amigo invisível enviou-me um anjo. O anjinho nasceu com 700 gramas, cabia na palma de minha mão. Minha mulher, na época, entregou-se toda nos desvelos com a pequenina. Ela ficou 02 meses na incubadora no hospital Matter Dei em Belo Horizonte. E eu no Peba. Quando fui buscá-la, aquele anjinho loiro, sorridente, pequenino, tive que segurar as lágrimas. Voltei para minha casa, apaixonei-me por minha filhinha, Patrícia, loirinha linda, branquinha igual a neve. Eu tinha motivos para sorrir de novo, para sair da vida boêmia que vivia. Eu era ela. Ela era eu. Vivíamos juntos. Ensinei-lhe inglês. A mãe ficava com raiva, pois não entendia o que ela dizia. Eu agradecia, todos os dias, ao meu amigo invisível pelo anjo que me dera!
Construí uma casa com piscina. Numa manhã de novembro de 1995, meu anjinho foi banhar na piscina e nunca mais voltou. Fiz respiração boca-a-boca, postei-me de joelhos, olhei para cima, para os lados, gritei, berrei: “AMIGO INVISÍVEL!! CADÊ VOCÊ?? NÃO FAÇA ISTO COMIGO!!”
Não teve jeito. Ela se foi. Minha vida, meu tudo, foi embora. Mandei meu amigo invisível para aquele lugar. Apontei uma arma para a cabeça, puxei o gatilho. A bala mascou.
Estive anos no limbo. Entreguei-me à mundana vida de vez. Aí, mais uma vez, meu amigo invisível veio me visitar. Não o recebi direito. Aos poucos fui tentando compreender a razão de tudo aquilo. Tudo dava certo para mim. Mesmo quando ele colocou uma víbora, uma mulher sem caráter na minha casa por mais de 10 anos! Eu não sou Jó, meu amigo…
Ele me parece tão solitário no seu imenso universo. Sabedor de sua imponência, assim na terra como nos céus, sem ninguém para desafiá-lo! Estará ele sozinho na imensidão de seu poder? Sem ter alguém para brincar com ele? Faça-se a luz! E a luz foi feita. O mundo sem nada! Só Ele naquela escuridão sem fim. Será que Ele é feliz? Tão poderoso, sem ninguém para desafiá-lo!
Sinto-o comigo a todo instante. Sinto-me iluminado. Ele pode ser invisível, mas a presença dele não é!
Costuro em mim pedaços do mundo, e levo minha vida feito menino endiabrado…
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