No segundo ano de seu primeiro mandato, em março de 2004, o governador Simão Jatene encaminhou ao então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ofício alertando sobre as consequências danosas para a economia do Pará e do Brasil derivadas da inércia do governo federal na conclusão de três obras importantes para o desenvolvimento da região: as rodovias BR-163 (Cuiabá-Santarém), BR-230 (Transamazônica) e a hidrovia Araguaia-Tocantins. O documento, recebido pelo gabinete pessoal da Presidência da República, detalha ainda que, segundo estimativas da época, o conjunto das obras exigiria um investimento da ordem de R$ 1,6 bilhão.
No ofício, o governador Simão Jatene chegou a propor que, diante do equilíbrio financeiro e capacidade de endividamento do Estado, o Pará participasse das obras por meio de financiamento, assumindo até 30% do valor orçado para a execução das mesmas, ou seja, com cerca de R$ 330 milhões. O documento foi publicado nesta segunda-feira (20), em postagem feita pelo governador Simão Jatene numa rede social e que pode ser lida na íntegra aqui.
Apesar da cobrança e oferta de apoio, as obras nas rodovias não foram concluídas e as consequências se agravam em velocidade geométrica. Desde o início de fevereiro deste ano, a BR-163, por exemplo, virou um imenso atoleiro. Duas semanas atrás, cerca de três mil caminhões ficaram retidos nos trechos mais críticos da rodovia, formando um engarrafamento de quase 50 quilômetros.
Uma Sala de Situação chegou a ser montada no quartel do Corpo de Bombeiros em Itaituba, reunindo órgãos e servidores dos poderes estadual, municipal e federal, como a Secretaria de Transportes do Pará (Setran), o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT), a Defesa Civil Estadual e o próprio Corpo de Bombeiros, entre outros.
Prejuízos – A rodovia BR-163 é a rota preferencial dos produtores de soja do Centro-Oeste. Tornou-se o caminho mais rápido e barato para chegar ao mercado internacional, porque dá acesso aos portos de Miritituba, em Itaituba, e de Santarém. Porém, nesta região alternam-se dois períodos climáticos bem distintos: o das chuvas e o da estiagem.
De novembro a março predominam as chuvas, que costumam ficar mais intensas no trimestre dezembro-janeiro-fevereiro, marcado por precipitações, superiores a 900 mm. Isso tem feito com que, aliada à falta de pavimentação, as estradas acabem criando áreas de atoleiros e buracos.
O DNIT enviou, após a repercussão das filas de caminhões nas proximidades de Trairão, equipes para um trabalho paliativo, que já foi interrompido duas vezes. A urgência, após o período chuvoso, é de fato proceder pela pavimentação definitiva. É uma providência esperada há quatro décadas, desde a criação da rodovia. Mais recentemente, tornou-se emergencial por causa da criação do Arco Norte de exportação, para o qual a BR-163 é imprescindível no escoamento da soja, e também por causa da supersafra de grãos. Mato Grosso produz 55 milhões de toneladas de grãos, mas tem potencial para alcançar em 2025 aproximadamente 85 milhões. A soja já é o segundo produto mais exportado pelo Brasil, atrás do minério de ferro.
Os 190 quilômetros não asfaltados da rodovia correspondem a menos de 10% da estrada inteira e a cerca de 20% do trecho paraense, que vai da divisa com o Mato Grosso até Santarém. Há quatro trechos precisando de asfalto. De Vila Isol à sede do município de Novo Progresso; de Santa Júlia a Moraes Almeida, em Itaituba; de Campo Verde a Rurópolis; e de Vila Planalto até Miritituba. O último, que passa por Miritituba, é considerado o mais crítico. Por ele circulam quase 95% da carga que sai de Mato Grosso em direção ao Pará.
O escoamento dos grãos de Mato Grosso pela BR-163 até os terminais portuários de Miritituba reduz em aproximadamente mil quilômetros a distância da viagem, se comparada com a extensão da saída pelos portos de Santos e do Paraná. Mas com a falta de pavimentação total da BR-163, o que seria economia vira prejuízo. Segundo o Governo do Mato Grosso, os produtores perdem ao ano cerca de R$ 1 bilhão com essa situação. Com a projeção de aumento das exportações, os produtores de soja passariam a perder R$ 2 bilhões.
Cobrança pela logística – Os caminhões que saem do norte de Mato Grosso levavam em média sete dias para chegar aos portos do Sudeste e do Sul, enquanto que para Miritituba são apenas três dias. Mas essa economia de quatro dias estancou no atoleiro por duas semanas. “Se antes tínhamos alguns dias de vantagem em relação aos outros percursos, agora, por causa de 190 quilômetros não asfaltados, temos duas semanas de atraso, com seus respectivos custos”, observa o engenheiro Kleber Menezes, secretário de Transportes do Pará. “Isso é insustentável”, define o titular da Setran, que esteve no local, assim como o secretário de Infraestrutura e Logística de Mato Grosso, Marcelo Duarte, no final de fevereiro.
Os depoimentos deles revelam a impaciência dos dois estados com a omissão do DNIT. “Visitamos a BR-163 para unirmos forças ao Estado do Pará e, de uma vez por todas, colocarmos na agenda de trabalho do governo federal a definitiva pavimentação desta importante rodovia que escoa as riquezas do agronegócio”, disse Marcelo Duarte. “Vamos cobrar ações efetivas para tirar do papel este projeto de pavimentação”.
“Chegamos ao limite. Ficar mais de 15 dias com cinco mil caminhões atolados na estrada é algo inimaginável nos tempos atuais. É o fundo do poço. Daqui para frente, a gente tem que cobrar do governo federal que essa pavimentação ocorra efetivamente, para que os estados do Norte do país tenham esse corredor logístico gerando emprego, renda e oportunidades. E não terror e caos”, afirmou Kleber Menezes. “Já passou da hora de o governo federal priorizar a conclusão desta rodovia”.
Memória – Nestes 13 anos, desde que o apelo do governador Jatene chegou ao ex-presidente Lula, sem resposta, o Pará vem fazendo a sua parte. Tanto é que o potencial logístico do Estado já foi certificado pela Financial Times Magazine, uma das principais publicações econômicas do planeta. A revista classificou o Pará como “Estado do Futuro” e um dos melhores destinos para investimentos, dada sua localização estratégica em relação à América do Norte, Europa e Ásia.
Instituições isentas, como a Confederação Nacional dos Transportes, confirmam o esforço do governo local em melhorar a qualidade das rodovias estaduais. A avaliação positiva (ótimo e bom) das condições das estradas paraenses saiu de 0,4% em 2011 para 23,3% em 2015. Nenhuma estrada paraense recebeu o conceito “péssimo”, enquanto 21,7% das rodovias federais tiveram essa avaliação pelos critérios da CNT.
Mas ainda que tenha virtudes, o Estado paga por vícios alheios. No caso das duas rodovias, o pecado da omissão dura 40 anos. As cenas de caminhões atolados no lamaçal da BR-163 também se repetem na BR-230. A Transamazônica é a perfeita tradução da negligência federal, na qual o Pará tropeça enquanto tenta consolidar sua vocação como corredor de exportação. Inaugurada há quase 45 anos, permanece inacabada até hoje. Está em território paraense o pior trecho dos mais de quatro mil quilômetros que rasgam o País de Leste a Oeste, cortando sete estados.
Dívida com a Amazônia – A Transamazônica entra no Pará pela cidade de Palestina, avança por 17 municípios e abre caminho até Jacareacanga, de onde segue para o Estado do Amazonas. Conecta-se com as mais importantes rodovias federais e estaduais, cruza os grandes rios Tapajós e Xingu, percorre municípios do porte de Marabá, Altamira e Itaituba.
“É um elo importante na cadeia logística e de transporte do Estado. Desde que esteja sólida e não se desmanche uma vez por ano, na previsível temporada de chuvas. O trecho inacabado da Transamazônica assegura à rodovia apenas uma ligação com o passado e não um novo papel no futuro”, destaca Kleber Menezes. Para ele, se as obras da Transamazônica e da Santarém-Cuiabá fossem finalmente concluídas, ainda que com atraso, aí sim, teriam suas importâncias estratégicas sedimentadas, consolidando um eixo de desenvolvimento indispensável à economia paraense e decisivo para o futuro do Brasil.
Além disso, como lembra o governador Simão Jatene no ofício entregue ao então presidente Lula, no dia 10 de março de 2004, no qual o Pará se propõe a assumir parte dos custos dessas obras, a conclusão das rodovias BR-163 e BR-230 resgataria “dívidas históricas” do governo federal com os paraenses e com os milhares de brasileiros que foram incentivados a se deslocar rumo ao Norte, acreditando que chegariam a uma nova fronteira de desenvolvimento.
Por Governo do Estado do Pará
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