Cresci vendo minha mãe apanhar quase toda a semana. Também, durante minha infância e parte da adolescência, apanhei muito! Tanto de meu pai quanto de minha mãe. Os que eduquei e ajudei a criar, fossem filhos, sobrinhos, primos, apanharam de mim.
A chamada “zona de conforto” é entendida como aquela fase de comodismo e prazer em que a pessoa aceita a rotina como uma coisa boa e confortável e não se arrisca a buscar algo melhor. Ou seja, quem está confortável e tranquilo à beira das piscina, com fartura de comida e bebida, dinheiro no bolso e boas companhias, vai se aventurar no deserto para quê?
O que minha mãe fez para mudar a rotina de violência que sofreu? Ela disse: BASTA! Estudou, depois dos 35 anos e se formou em direito! Mas, o que a fez suportar as tacas por tantos e tantos anos antes de se separar? A zona de conforto. Ela apanhava, mas tinha 08 filhos para criar e educar! Era induzida pela tradicional família mineira a suportar tudo em prol da família. Os murros, pauladas que levou, fizeram parte da zona de conforto dela.
Pouca coisa mudou na sociedade. Esta história de que “mulher que apanha de marido e continua dentro de casa, merece apanhar”, é explicação de quem não tem o mínimo de experiência e entendimento dos reais fatos que levam a mulher a suportar tanta humilhação! Há muita coisa envolvida. Para quem está fora, acha que vale a pena ligar para o disque denúncia e acabar com a violência praticada contra a mulher! Eu já fiz isto. Liguei para a polícia, porque eu não aguentava mais ver uma vizinha minha apanhar todos os dias do marido! A policia veio e o levou. Ele perdeu o emprego na Vale. Mudou-se para não sei onde. Dias depois, recebi uma ligação da mulher dele. Ela chorava ao telefone e me disse: “Muito obrigado por ter denunciado meu marido! Mas o senhor destruiu minha vida e de minha família!” Fiquei sabendo que ela continuou com ele. E continua a apanhar mais ainda!
Algumas aguentam a violência por amor; outras, por comodismo e dependência; outras, por medo; outras, por apenas esperarem o momento certo de dar adeus! Nesta semana, no dia 07 de agosto de 2018, a Lei Maria da Penha (lei 11.340/2006) completou 12 anos! E aí? O que mudou? Como advogado, afirmo que é muito difícil proceder com o B.O. As mulheres são induzidas a “deixar pra lá”. São tantos os obstáculos e burocracia, que elas desistem. Corrijam-me se eu estiver errado! Também, como advogado, digo que a mulher não pode se furtar de fazer valer a Lei. Se a polícia não ajudar, procure o Ministério Público! Se o Ministério Público for omisso, denuncie na corregedoria, na procuradoria de justiça, no CNJ, onde for! Mas não desista, não aceite a zona de conforto!
Sair da zona de conforto não é bom. É arriscado! Mas é um risco necessário! Tive um relacionamento por muitos anos com uma mulher sem caráter! No entanto, nunca notei as traições dela, pois eu estava na minha zona de conforto! Foi difícil sair delas, mas estou bem melhor hoje!
A zona de conforto faz a pessoa se acomodar com o pouco que ganha. Seja um gari, um médico, um empresário, quem for, basta se acomodar que jamais irá crescer. Mas, o que queremos na verdade senão atingir a zona de conforto? Se ganho bem, levo a vida numa boa, para que arriscar? Conheço uma pessoa, ex-aluno meu, que largou o curso de medicina no quinto ano para ir tocar numa banda fajuta e ganhar um salário mínimo por mês! Conheço outra, analista judiciário, que passou num concurso para juiz, com salário acima de 20 mil reais por mês, pediu exoneração do cargo de juiz e voltou a ser analista com um salário de 8 mil reais mensais! A pessoa me disse que estava muito mais confortável como analista que como juiz!
Cada caso é um caso! Mas é inaceitável a violência! Não é fácil controlar o instinto de violência que existe em nós. Mas é preciso! Denunciar qualquer tipo de abuso, violência contra os fracos, oprimidos, os rejeitados é de suma importância. Caberá à polícia, à justiça, investigar e apurar a verdade dos fatos. A pessoa que sofre a violência pode chegar à delegacia e dizer que é
mentira, que não sofreu violência. Mas, aí, é problema dela. O denunciante dormirá com a consciência tranquila por ter feito o dever de casa!
Já ouviu falar de pessoas que largaram tudo, riqueza, vida boa, para se aventurar pelo desconhecido, começar tudo de novo? E aí? Você tem coragem para tanto? Ou prefere ficar na sua zona de conforto?
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